Classic CarsSlide

Arquivos Chrysler: as outras duas encarnações da Rampage

Compartilhe!


O nome Rampage, que em inglês significa “tumulto”, anteriormente batizou uma picape que teve vida curta nos Estados Unidos e também foi usado num concept truck. Foi recuperado em 2003 pela Stellantis na picape RAM brasileira. Isso apenas no nome. Então, vamos relembrar com AUTO&TÉCNICA as picapes Dodge Rampage originais.

Com o nome Rampage retornando ao mundo do automóvel na forma da picape média monobloco RAM Rampage em 2023 para o mercado sul-americano, vale a pena revisitar esse ponto pouco conhecido na história da Dodge. A verdade é que a RAM não está sozinha na atividade de reviver antigos nomes e emblemas de identificação: Ford Bronco, Maverick e Lightning; Chevrolet Blazer; Dodge Dart, Charger e Hornet; Land Rover Defender; Jeep Wagoneer, Grand Wagoneer e Gladiator; GMC Hummer (marca revivida como modelo da GMC); Fiat Topolino… A lista continua e é longa.

É claro que a Rampage 1982 –um utilitário cupê monobloco, que era carro na dianteira e picape na traseira– não foi o primeiro modelo desse tipo. Bem antes dela existiu a Ford Ranchero em 1957 e a Chevrolet El Camino em 1959, e depois é que surgiu a Dodge Rampage original. Se é uma picape real ou não, nós deixaremos para você decidir. São modelos completamente adoráveis e totalmente detestáveis ao mesmo tempo. A Dodge Rampage foi fabricado pela Chrysler de 1982 a 1984, tornando sua curta carreira de três anos perdoavelmente esquecível. A Rampage foi montada na fábrica de Belvidere, da Chrysler; uma versão rebatizada, a Plymouth Scamp, ingressou no mercado em 1983, e durou apenas aquele ano.

A Dodge Rampage original era baseado na plataforma “L”, compacta, da Chrysler (motor dianteiro transversal, monobloco com tração dianteira) que foi aplicada a vários veículos da marca entre 1978 a 1990. A história dessa plataforma é curiosa e veremos a seguir. A Rampage era no Dodge Omni, usando os painéis frontais da carroceria do cupê Omni 024 e suspensão dianteira do hatch Omni. Na traseira, tinha suas próprias molas e amortecedores.

Aqui cabe um parentese. Para variar, a Chrysler Corporation não ia nada bem no final dos anos 1970. Uma tentativa de salvar a empresa estava na Europa. Vamos lembrar que, quem antecedeu a Chrysler do Brasil no final dos anos 1960, foi a Simca. A marca francesa ainda existia na França e fazia parte da Chrysler Europe.

Assim, durante os anos 1970, a Chrysler trabalhou no chamado “Projeto C2”, para ser o substituto do Simca 1100. Era o Horizon, um hatch mais atual, de linhas retas, tração dianteira e motor dianteiro transversal. Seu alvo era o Volkswagen Golf, Opel Kadett, Ford Escort e outros modelos do segmento. Na prática era uma versão reduzida do Simca Alpine, maior, e o Horizon por isso nasceu como um carro um pouco mais largo, algo que seria importante no futuro.

Lançado em 1978 e vendido como Simca na França e como Chrysler no restante da Europa, o carrinho francês até foi eleito “Carro do Ano” em 1979, mas isso não foi suficiente para evitar o fim da Chrysler Europe. Por isso, a Simca foi comprada pela Peugeot e unificada com outra marca tradicional, a Talbot. Assim, o hatch acabou sendo vendido como Talbot Horizon na Europa até 1986.

A Chrysler ficou com todos os dados e planejamento do “Projeto C2”, e aproveitou para replicá-lo nos Estados Unidos, para armas para enfrentar os compactos japoneses que estavam desembarcando por lá. Em janeiro de 1978 foi então lançada a versão norte-americana do “Projeto C2”: os Dodge Omni e Plymouth Horizon. Eram os primeiros carros modernos realmente de baixo custo e com tração dianteira produzidos nos Estados Unidos, e o primeiro Chrysler com esta configuração mecânica.

Foi vendido por 11 anos praticamente sem mudanças; foram fabricados cerca de 2.500.000 de Omni e Horizon, sendo as versões com emblema Plymouth, com apelo ligeiramente esportivo por conta do passado da marca, mais populares do que os Dodge. Mas mais importante do que a participação deste modelo no processo de recuperação financeira da empresa (mais um…), o “Projeto C2” serviu de base para a Chrysler criar novos projetos para o futuro, onde a plataforma dos Omni e Horizon -identificada pela letra “L”- era a base de novos carros para os anos seguintes.

Um destes produtos foi lançado em 1979: o Dodge Omni 024 e seu eterno parceiro da Plymouth, o Horizon TC3. Com duas portas e estilo mais esportivo, foi fabricado até 1983, equipado com dois motores de quatro cilindros: um 1700 cm3 fornecido pela Volkswagen e o 2.2 da própria marca. Mesmo sendo vendido até no Japão, não foi um sucesso de vendas e acabou sendo substituído por um outro modelo, ainda baseado na plataforma “L”. Era o Charger, sem motores V8 e sem tração traseira. Sacrilégio ou não, foi vendido até 1987 e trazia versões turbo criadas por Carroll Shelby. Na Plymouth, a mesma mudança de geração, de TC3 para Turismo.

A picape Plymouth Scamp.

De volta à história da Rampage, ela usava motor de quatro cilindros em linha, 2,2 litros com carburador, também herdado do Omni, que produzia até 99 cv. Este motor, sem maiores destaques ou elogios, tornava a picape candidata perfeita para a troca por um Hemi… Usava caixas de câmbio manuais de quatro e cinco velocidades, ou automática de três marchas. Pesava cerca de 1040 kg.

Seu consumo de combustível era de 9 km/litro na cidade e 12 km/l de gasolina na estrada, e junto com sua capacidade de carga útil de 520 kg (nada mau, considerando que a El Camino, que era maior, tinha capacidade até 566 kg) foi um golpe duplo para a Rampage.

A picape Dodge Rampage tinha 4.669 cm de comprimento, 1.696 cm de largura e 1.313 cm de altura; a sua distância entre-eixos era de 2.647 cm. Essas medidas a tornavam, um pouco mais mais longa que uma picape Subaru BRAT 1982 e mais curta que uma Chevrolet El Camino 1982. Estranhamente, tem exatamente o mesmo comprimento de um Subaru WRX 2023… sem que isso não signifique nada, apenas curiosidade

O Dodge Rampage teve vida curta e durou apenas três anos, mas nessa época ainda teve tempo de receber um facelift em 1984 (acima) na forma de uma dianteira compartilhada com o Charger de então. Essa mudança trouxe quatro faróis (ao invés de dois), grade e pára-choque diferentes e um borrachão ao redor do para-choque dianteiro.

As vendas da Dodge Rampage não representaram exatamente um sucesso comercial, totalizando 37.401 Rampage entregues em três anos de produção. Para efeito de comparação, durante esses mesmos três anos, a Chevrolet produziu cerca de 70.000 El Camino. Distribuídas pelos três anos, foram comercializadas 17.636 unidades em 1982: 8.033 em 1983 e 11.732 em 1984.

EDIÇÕES ESPECIAIS

Há o registro de que existiu uma Shelby Rampage -não oficial- que os engenheiros da Chrysler e Shelby construíram para Carroll Shelby fora do horário de trabalho, conhecida como “Street Fighter”. Depois veio a Shelby California Rampage e houve também uma edição limitada “Direct Connection 1984 Rampage”, para o mercado da Califórnia, apresentando a dianteira especial do Shelby Charger, rodas de liga-leve de 15 polegadas e um “pacote” de detalhes aerodinâmicos. Apenas 250 Rampage Direct Conection foram feitas, disponíveis em Preto, Vermelho Garnet e Azul Santa Fé.

A absolutamente rara Dodge Shelby Street Fighter Rampage, com sua cara de poucos amigos

Duas décadas após o desaparecimento da Rampage, a Dodge apresentou um interessante concept truck batizado de Rampage, para exibir durante a temporada de Salões do Automóvel naquela metade da década de 2000. Combinava uma cabine de passageiros de tamanho generoso com excelente espaço para carga, graças a uma caçamba de um metro e meio de comprimento. Tinha a largura de uma Dodge Ram da época, com o comprimento total de uma Dodge Dakota.

A Dodge Rampage Concept 2006, na cor carbono líquido, tinha motor 5.7V8 Hemi (345 cavalos de potência e 50 mkgf de torque), acoplado a uma caixa de câmbio de automática de cinco marchas, tração dianteira e suspensão independente nas quatro rodas.

O conceito, de cinco lugares, tinha a fileira de trás “Stow-N-Go”, semelhante a usada nas minivans da marca, e banco do passageiro dianteiro que podiam ser dobrados até o chão; portas traseiras deslizantes e console central “flutuante” junto ao painel.

O conceito utilizava uma parede traseira móvel (acima), que possibilitava muitas opções de utilização. Para facilitar o carregamento, a tampa da caçamba podia ser usada como rampa. O interior era absolutamente revolucionário para a época e era facilmente acessado graças à falta de colunas B.

O concept truck Rampage preencheu na história da Chrysler a lacuna entre a Rampage original de 1982 e a nova Rampage de 2023. Rampage era o nome certo para a Stellantis tirar o pó e reviver? Sim, em especial aplicado junto com o nome RAM. Esta segunda chance fez bem ao nome, caso contrário poderia não ter havido esta terceira chance.


Compartilhe!