Ford: os Mustang que nunca existiram
O caminho que o Ford Mustang percorreu em toda sua trajetória teve muitas nuances, durante os quase 55 anos de existência. Ele foi desde um cupê acessível até referência de desempenho. Quando foi lançado, na metade de 1964, era construído na mesma plataforma do Ford Falcon, e teve o seu desenho inspirado no conceito Ford Allegro, apresentado no ano anterior, e equipado com motor V8.
Mas esta matéria não é sobre o Mustang que todos nós conhecemos, mas sim sobre aqueles que nunca saíram dos estúdios de desenho da Ford, com várias alternativas que testavam novas tendências e as mudanças do mercado.
Logo no início da produção, foram propostas carrocerias alternativas ao cupê, para ampliar o portfólio de modelos. Em 1965, por exemplo, foi construído um Mustang de quatro portas, mas este nunca passou da fase inicial de protótipo.
O mesmo não aconteceu com esta wagon, o Mustang Shooting Brake, que nasceu do sonho de três fans da Ford: Robert Cumberford, que era designer; Barney Clark, executivo do departamento de marketing, e Jim Licata, que participou no projeto. Eles, com a ajuda da empresa italiana Costruzione Automobili Intermeccanica, transformaram em 1965 um Mustang Coupé numa wagon.
Quando ficou pronto, apresentaram o protótipo para a Ford e várias empresas independentes de produção de automóveis especiais. A Ford nunca passou este modelo para a produção, mas várias empresas construíram modelos wagon do Mustang. No entanto, o protótipo original foi perdido.
É interessante que o Mustang mais desprezado pelos fãs do carro, o “Fox”, foi aquele que passou por um processo de desenho muito demorado, com várias propostas diferentes. No início dos anos 1970, a Ford teria de fazer várias escolhas, se quisesse manter viva a lenda do Mustang, pois naquela época várias foram as restrições impostas pela legislação americana, como no consumo de combustível devido à situação global da falta do mesmo e às novas regras para emissões e testes de colisão.
Inicialmente a Ford manteve a plataforma original, mas com uma carroceria mais longa e luxuosa, mas ficou logo claro que não iria dar certo. Então, recorreu à plataforma O.G., produzindo algo que se assemelhava mais a um Ford Maverick alargado, do que propriamente a um Mustang.
Em 1971, em colaboração com a Ghia, desenvolveram dois protótipos que quase foram colocados em produção, mas no final somente a redução da distância entre-eixos transitou para o Mustang II de produção. Estes protótipos mantinham ainda o estilo de cupê de luxo, e foram buscar inspiração aos veículos europeus com o “nariz” de tubarão.
A própria Ford desenvolveu um protótipo do Mustang, com elementos que seriam utilizados no Ford Granada, lançado no ano seguinte, mas também no Ford Torino de 1973.
Mas o protótipo mais interessante, vindo da Ghia, foi quando esta pensou em ousar um pouco mais, com um desenho muito à frente do tempo, com linhas semelhantes aos esportivos japoneses lançados nos anos 1980. Indiscutivelmente, este protótipo é muito mais bonito do que o Mustang II de produção, mas lançar um muscle car com este visual na década de 1970 seria um risco.
Nos anos 1980, com o aumento da venda dos esportivos japoneses, que eram na sua maioria de tração dianteira, o Mustang entrou numa profunda e quase incontornável crise existencial, pois os modelos da sua categoria, com motores V8 e tração traseira, estavam perdendo terreno.
Naquela época, a Ford tinha feito parceria com a Mazda, para a estranha criação de um modelo que combatesse o Mustang, e foi dado o a ele o código SN-16. O protótipo desenvolvido com ajuda da Ghia, nunca passou do modelo em argila, e até tinha o símbolo do Mustang virado ao contrário.
Desde de 1987 que estava sendo desenvolvida a nova plataforma para o Mustang, e os fãs do modelo não estavam contentes com a possível mudança de tração, por isso, enviaram cartas à Ford contra essa ideia. Apesar de o Mustang não ter sido lançado com esta base, o desenho deste modelo passou para a produção, com o lançamento do Ford Probe, um cupê que nunca conseguiu vingar no mercado, assim como o “primo” Mazda MX-6.
Todas estas indecisões afetaram o desenvolvimento do novo Mustang e, com isto, a Ford continuava a vender o Mustang Fox, em conjunto com o Probe, adiando a sua substituição, em parte porque o desenvolvimento do Mustang de tração dianteira tinha “roubado” imenso dinheiro dos cofres da marca. Mas ainda assim, a Ford continuava insistindo na tração dianteira, ao invés de desenvolver uma nova plataforma de tração traseira.
Em 1990, ficou claro que um Mustang V8 de tração dianteira não iria ser bem recebido, mas também não restava muito dinheiro para o desenvolvimento de um carro novo do zero. Assim, teria que se economizar no novo modelo, tanto no desenvolvimento do desenho, como do chassi.
O resultado final foi a plataforma SN95, também conhecida por “Fox-4”, que modernizou o estilo do Fox original e passou a ser equipado com o motor Ford Modular 4.6V8. Mas o aspecto exterior teria de ser diferente e não poderia ser somente um Fox atualizado, pois isso seria desastroso para as vendas.
Por essa razão, a Ford procurou integrar no novo desenho elementos que fizessem lembrar o Mustang original, tornando-se num dos primeiros carros modernos com interpretação retrô. Assim sendo, foram desenvolvidos três protótipos e cada um recebeu um nome de uma estrela de Hollywood.
O primeiro desenho é o Mustang “Bruce Jenner”, com vários elementos que passariam posteriormente para a produção, tanto no Ford Contour, derivado do Mondeo vendido na Europa, e no Ford Taunus. Mas suas linhas eram demasiadamente suaves para um Mustang.
O segundo desenho recebeu a denominação “Rambo”, e pela denominação pode-se assumir em quem foi inspirada pelo seu visual muito agressivo, tendo ido buscar ideias nos GM F-body, como Camaro e Firebird, que seriam lançados na mesma época. E, ao contrário do anterior, este era demasiado agressivo, mais do que aquilo que os fãs poderiam aceitar.
O último ficou conhecido como “Schwarzenegger”, e foi o desenho escolhido para seguir para a produção, com vários elementos inspirados no Mustang original, tal como a Ford queria, assim como um capô longo e traseira curta, que evocava os primeiros cupês da linha. Foi este aspecto, que deu novo fôlego às vendas do Mustang, num momento em que estava programado para sair de linha.
Além dos três protótipos mostrados acima, foi produzido um outro, que seria uma combinação entre o “Rambo” e o “Schwarzenegger”. Como curiosidade, o Oldsmobile Alero, lançado em 1998, assemelha-se a este protótipo do Mustang, que foi construído em 1990.
Pelo meio do caminho ainda foram propostos outros desenhos para o Mustang, de modo a alargar a imaginação dos desenhistas, mas que não saíram do papel. Um deles foi buscar a inspiração no Mercedes-Benz SL R129, que tinha sido lançado em 1989 e que poderia ser uma tentativa de vender o Mustang para a Europa.
Outro desenho era de um cupê mais compacto, e que se assemelhava muito ao Dodge Avenger, mas este só foi lançado em 1994, o que leva a pensar que algum desenhista na Chrysler se inspirou neste desenho do Mustang, ou possivelmente trabalhou na mesma equipe.
OUTROS MUSTANG CURIOSOS…
Os protótipos iniciais traziam as primeiras ideias do que seria o Mustang: este modelo foi batizado de Aventura e, posteriormente, de Allegro, mas foi rejeitado por ter apenas dois lugares.
Em 1962 foram definidas as dimensões do Mustang, que já estava ganhando forma. A equipe de desenho liderada por Gene Bordinat já define perfeitamente as dimensões do modelo final.
Mais próximo do Mustang: em 1963 o modelo em argila mostrava as linhas quase definitivas do Mustang, apesar da dianteira ainda trazer um puma no lugar do cavalo. Nos painéis dianteiros há a inscrição “Torino”.
Em 1964, pouco antes de ser lançado, a Ford pensou num cupê de dois lugares, menor, para concorrer com os modelos europeus da Jaguar, MG e Austin.
Esportivo radical para 1966: o Mach I Concept foi apresentado no Salão de Detroit daquele ano, com o objetivo de ser uma atualização do Mustang. Apesar de alguns itens de estilo terem sido incorporados no Mustang II, este conceito nunca chegou a ser produzido.
Em 1971 se pensou numa renovação total: a única coisa que faz lembrar o Mustang original neste protótipo é o emblema do cavalinho na dianteira.