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Maserati Khamsin by Bertone, o vento do deserto

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Quando em janeiro de 1968 a Citroën assumiu o controle da Maserati, o primeiro modelo que os franceses encomendaram foi um esportivo de dois lugares e motor central. Assim nasceu o Bora, que foi lançado em no Salão de Genebra em março de 1971, equipado com o confiável motor V8 de comando de válvulas duplo da Maserati.

por Ricardo Caruso

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A plataforma Bora foi então adotada para um modelo mais simples, com assentos traseiros apenas “simbólicos”. Revelado no Salão de Paris em outubro de 1972, surgia o Merak, com motor 3.0V6 da Maserati, que havia sido originalmente desenvolvido para o Citroën SM. Os Bora e Merak foram inicialmente vendidos junto com três esportivos de motor dianteiro: Indy, Ghibli e Mexico. No entanto, Ghibli e Mexico logo saíram de linha para dar lugar a um esportivo (que eram chamados de GT, ou Gran Turismo, na época) mais moderno, que ficou em produção até 1982.

Era o protótipo “Tipo AM120 Khamsin”, que foi revelado no Salão de Turim em novembro de 1972. Ele surgiu apenas seis semanas depois da apresentação do Merak. A versão de produção foi lançada no Salão de Paris em outubro de 1973, e os primeiros carros para clientes foram entregues antes do final daquele mesmo ano.

O Khamsin foi o último Maserati projetado pelo engenheiro-chefe da empresa, Giulio Alfieri, e o primeiro modelo de produção em série da empresa finalizado pela Bertone. Assim como vários de seus antecessores, o novo carro da Maserati recebeu o nome de um vento do deserto. Aqui vai uma dose de cultura inútil: o Khamsin é um vento quente, seco e arenoso que sopra do sul para o sudeste no norte de África e na península Arábica. O nome Khamsin vem do árabe e significa “cinquenta”, referindo-se ao período de 50 dias em que o vento sopra sobre a região. O Khamsin é também conhecido como “vento do deserto” e é lembrado pela sua intensidade e capacidade de causar mudanças significativas no clima local. O Khamsin também pode ser chamado de Chamsin, Hamsin ou Khamaseen, que é o termo mais popular no Egito. 

De volta ao carro, embora oferecesse um layout mais tradicional do que Bora ou Merak, o Khamsin foi projetado com um sistema completo dos famosos conjuntos hidráulicos da Citroen, que eram usados ​​para controlar a direção hidráulica sensível à velocidade, freios a disco ventilados nas quatro rodas, comando da embreagem, operações dos bancos e os faróis retráteis. Imagine o transtorno…

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O motor foi montado na frente, posicionado bem recuado na carroceria de aço, para conseguir a distribuição de peso de 50/50. Para isolar os passageiros do ruído e vibração da transmissão, a Maserati adicionou um sub-chassi traseiro amortecido para suportar a suspensão e o diferencial. Com 2550 mm, a distância entre-eixos do Khamsin era idêntica à do Ghibli. Mas onde o Ghibli usava um eixo traseiro já antiquado, o Khamsin apresentava suspensão independente double wishbone.

Assim como na Ferrari BB e no Lamborghini Countach, unidades simples de mola/amortecedor foram instaladas na frente, e duas de cada lado na traseira. Barras estabilizadoras foram aplicadas em cada extremidade. A Maserati usava as mesmas rodas de liga-leve Campagnolo modelo Starburst, 15×7,5, vistas no Ghibli. Essas belas rodas foram calçadas com pneus Michelin XWX 215/70-15 e fixadas no lugar com uma única porca de travamento central. Comparado com o seu antecessor, a bitola era 40 mm mais larga na frente e 68 mm mais larga atrás.

Para conseguir algum espaço para bagagem, os tanques de combustível eram de tamanhos diferentes, com capacidade total de 95 litros e foram instalados em ambos os lados dos assentos traseiros. Pelo mesmo motivo, a Maserati posicionou o estepe abaixo do radiador na dianteira.

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Fora a adição da ignição eletrônica Bosch, o motor Khamsin era idêntico ao do Ghibli SS. Um V8 de 90°, totalmente em liga-leve, com comando de válvulas duplo no cabeçote, duas válvulas por cilindro e lubrificação por cárter seco. Com diâmetro e curso de 93,9 mm x 89 mm, a cilindrada era de 4.930 cm3.

A típica taxa de compressão de 8,5:1, que era usada na maioria dos motores Maserati V8 daqueles tempos, foi mantida, e quatro carburadores Weber 42 DCNF 41 foram usados. A potência máxima era de 320 cv a 5.500 rpm e 49 mkgf de torque a 4.000 rpm. Como padrão, a Maserati empregava caixa de câmbio manual ZF de cinco marchas com embreagem de disco seco simples e diferencial de deslizamento limitado. Uma transmissão automática Borg-Warner de três marchas era opcional.

A Maserati trabalhava com vários estúdios, como Touring, Ghia, Frua, Vignale e Ital Design, para dar forma aos seus modelos de produção em série. Para a Khamsin, a Maserati optou pela Carrozzeria Bertone, de Turim. Sob a direção do estilista-chefe Marcello Gandini, a Bertone se estabeleceu na vanguarda do desenho de carrocerias em forma de cunha. Criações inovadoras como o Alfa Romeo Carabo, Lamborghini Countach e Lancia Stratos impactaram; era fácil ver porque tanto a Maserati quanto a Ferrari romperam com as tradições e se voltaram para a Bertone no início dos anos 1970.

Na época, o desenho em forma de cunha era aplicado quase exclusivamente a modelos com motor central, porque um motor posicionado atrás da cabine era mais fácil de “esconder” com esse formato. Criar um perfil semelhante quando o motor estava na frente do carro seria mais difícil, mas o novo Maserati que surgiu do estúdio de Bertone provou ser um sucesso notável.

Seu formato aerodinâmico era elegantemente proporcionado com superfícies limpas e várias das características de marca registrada de Gandini. Isso incluía saídas de ar de resfriamento assimétricas no capô e uma tampa traseira com grande vidro -de largura total-, mais lanternas “flutuantes” (e parecidas com as usadas nas Alfa Romeo 2300 brasileiras) nas extremidades da carroceria; o painel entre as lanternas era de vidro, transparente. A enorme tampa traseira envidraçada e o painel entre as lanternas foram projetados para melhorar a visibilidade para trás e inundar o interior com luz natural.

Grades falsas de ventilação estava localizadas em cada coluna C; a do lado direito do carro escondia a tampa de abastecimento de combustível. Os painéis da carroceria do Khamsin foram fabricados inteiramente em aço.

Embora comercializado como um modelo 2+2, os bancos traseiros do Khamsin não tinham espaço suficiente para acomodar adultos. Além do material anti-reflexo aplicado no painel e no piso (que era acarpetado), quase todas as superfícies eram cobertas por couro de grande qualidade, algo raríssimo hoje em dia. Os bancos era confortáveis ​​para viagens longas, a visibilidade era muito boa e todos os controles fáceis de manusear.

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Observe o painel traseiro de vidro (recurso aplicado depois no Citroën XM) e as lanternas, parecidas com as usadas nas Alfa Romeo 2300 nacionais.

O painel era dividido em três seções. Diretamente atrás do volante havia um módulo retangular que abrigava o conta-giros e o velocímetro, junto com instrumentos menores para nível de combustível, pressão do óleo e temperatura da água. Ele também incorporava diversas luzes de advertência e interruptores.

A parte central do painel ficava acima do volumoso túnel de transmissão. Ele continha os controles de ventilação, relógio e medidores de pressão e temperatura do óleo. Também localizados neste painel central estavam os controles dos vidros elétricos e uma série de botões e alavancas, além do sistema de som. E na frente do passageiro o painel abrigava um porta-luvas.

Itens como ar-condicionado, vidros rayban, revestimentos todos em couro e coluna de direção ajustável eram equipamentos de série. O único opcional, que já mencionamos, era a caixa de câmbio automática de três marchas da Borg-Warner. Cada Khamsin pesava 1.635 kg, mas com velocidade máxima de 270 km/h e tempo de zero a 100 km/h de 6,1 segundos, o desempenho era muito interessante.

Os Khamsin destinados aos Estados Unidos eram equipados com luzes de presença laterais, sistemas de controle de emissões de poluentes, grandes para-choques de borracha e transmissão final mais curta, para melhorar a aceleração. Mais tarde, as lanternas traseiras foram reposicionadas e um para-choque de largura total foi adicionado.

O estranho reposicionamento das lanternas para a versão americana. Tudo por conta da legislação sobre pára-choques, que também foram mudados.

Além das diferentes lanternas traseiras, o protótipo Khamsin sem emblema, exibido no Salão do Automóvel de Turim no final de 1972, entrou em produção praticamente inalterado. Mas, infelizmente, logo depois que os primeiros carros começaram a ser entregues no final de 1973, o mundo foi atingido por uma crise energética, quando os membros árabes da OPEP anunciaram embargo às vendas de petróleo para os Estados Unidos, Reino Unido, Canadá, Japão e Holanda em resposta ao apoio dos Estados Unidos a Israel na “Guerra do Yom Kippur”, onde Egito e Síria (com o apoio de outras nações árabes) iniciaram uma campanha militar para recuperar territórios perdidos durante a “Guerra dos Seis Dias” de 1967 (quando Egito, Síria e Jordânia foram os envolvidos).

Os preços do petróleo subiram de maneira assustadora e permaneceram em níveis elevados pelos dois anos seguintes. A demanda por veículos que consumiam muita gasolina sumiu praticamente da noite para o dia. Com isso, os ambiciosos planos de expansão da Maserati foram colocados em espera, pois as vendas despencaram. A situação piorou em 1974, quando a Citroën foi declarada falida. Em maio de 1975, a direção da marca francesa anunciou que a Maserati também havia sido colocada em liquidação.

Em agosto de 1975, a Maserati passou para o controle de uma holding estatal italiana e de Alessandro de Tomaso. De Tomaso ainda estava cheio de dinheiro após vender sua empresa para a Ford em 1974. Novos modelos surgiram em 1976 (Kyalami) e 1979 ( Quattroporte Série 3), ambos modelos De Tomaso revistos e com motores Maserati.

A produção do Khamsin, Bora e Merak continuou inalterada.Em meio a essa turbulência, o Khamsin recebeu um leve facelift em 1975.Três aletas horizontais foram adicionadas na dianteira, para ajudar no arrefecimento; algumas pequenas revisões no conjunto de direção foram implementadas e o volante recebeu um ressalto acolchoado.

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A produção foi descontinuada em 1982, com 435 Khamsin fabricados entre 1974 e 1982 Destes, 71 eram com volante na direita e 155 exportados para os Estados Unidos. O Khamsin não foi substituído porque, no final de 1981, a era Biturbo da Maserati iniciou a tentativa de buscar maior volume de vendas para a empresa.


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