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Segurança: há 65 anos a Volvo apresentou o cinto de três pontos.

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Foi no dia 13 de agosto de 1959 que a então sueca Volvo (hoje uma empresa chinesa) entrou para a história da segurança automotiva em nível mundial. Precisamente nesse dia, há 65 anos, a Volvo Cars entregou o primeiro automóvel equipado com um cinto de segurança de três pontos, criação da própria marca que, inicialmente, gerou muita controvérsia, mas que rapidamente foi adotada por todas as outras fabricantes.

por Ricardo Caruso

Estava assim dado um enorme passo na melhoria da segurança ativa dos automóveis. Mas o seu sucesso não foi imediato. Na verdade, muitas pessoas, incluindo até jornalistas especializados desinformados (sim, eles já existiam, cresceram e se tornaram influencers…), consideraram o cinto de segurança -ainda mais de três pontos- um empecilho à liberdade individual, já que apertava o corpo d encontro ao banco e era incômodo de usar. Aqui no Brasil, muitas vezes ainda ouvimos esse tipo de crítica.

Estamos tratando da relação da Volvo com os cintos de três pontos. Na verdade os cintos de segurança -de dois pontos, ou sub-abdominais- foram inventados pelo engenheiro inglês George Cayley, para uso em seu planador, em meados do século XIX. No ano de 1885, a primeira patente conhecida para um cinto de segurança de automóvel foi criada por Edward J. Claghorn. Em 1903, o francês Gustave-Desire Leveau inventou um sistema de cinto de segurança com cintos diagonais ajustáveis ​​no colo e no peito. Mais adiante, em 1946, C. Hunter Shelden abriu uma clínica neurológica no Huntington Memorial Hospital em Pasadena, Califórnia.

No início da década de 1950, Shelden fez uma grande contribuição para a indústria automotiva com sua ideia de cintos de segurança retráteis. Isso surgiu de seu cuidado com o alto número de ferimentos na cabeça que eram atendidos nos pronto-socorros dos hospitais. Ele, por conta disso, investigou os primeiros cintos de segurança com projetos primitivos, que estavam envolvidos direto nesses ferimentos e mortes.

A Nash foi a primeira fábrica de automóveis americana a oferecer cintos de segurança como opcionais, em seus modelos de 1949. Eles foram aplicados em 40.000 carros, mas os compradores não queriam o recurso e solicitavam que os revendedores os removessem. O recurso foi notificado para a fábrica como “recebido com resistência de vendas intransponível” e a Nash relatou que, após um ano, “só 1.000 motoristas usavam os cintos”. A Ford ofereceu cintos de segurança como opção em 1955. Eles não eram populares, e apenas 2% dos compradores da Ford optaram em pagar pelos cintos de segurança em 1956. 

Para reduzir o alto nível de ferimentos que Shelden estava presenciando, ele propôs, no final de 1955, que cintos de segurança retráteis, volantes reposicionados mais baixos, tetos reforçados, barras de proteção, travas automáticas nas portas e dispositivos de retenção passivos, algo como primitivos airbags, fossem tornados obrigatórios. 

Glenn W. Sheren, de Mason, Michigan, apresentou um pedido de patente em 31 de março de 1955 para um cinto de segurança automotivo e recebeu a patente dos Estados Unidos 2.855.215 em 1958. Esta foi a sequência de um pedido de patente anterior, que Sheren havia apresentado em 22 de setembro de 1952. O primeiro cinto de segurança moderno de três pontos (o chamado sistema de retenção CIR-Griswold ), hoje comumente usado em veículos de consumo, foi patenteado em 1955 (patente 2.710.649) pelos americanos Roger W. Griswold e Hugh DeHaven .

A extinta Saab introduziu os cintos de segurança como equipamento padrão -sempre de dois pontos- em 1958. Depois que o Saab GT 750 foi apresentado no Salão de Nova Iorque em 1958 equipado com cintos de segurança instalados como padrão de fábrica, a prática começou a se popularizar, mas foram necessários mais alguns anos até que a maioria dos motoristas e o resto da indústria automotiva se convencesse que a sua utilização era de fato obrigatória e imprescindível, salvadora de vidas e minimizadora de ferimentos.

Um ano depois a Volvo deu o passo definitivo com o modelo PV544 com cintos de três pontos, e a entrega desse carro histórico foi feita numa concessionária Volvo de Kristianstad, Suécia, com a marca tornando-se a primeira fabricante automotiva mundial a equipar de série os seus automóveis com esse tipo de cintos de segurança nos bancos da frente. No mercado local, além dos PV544, também o P120 (Amazon) recebia este equipamento.

O engenheiro autor desta invenção foi o sueco Nils Bohlin (1920–2002, foto abaixo), que nasceu na cidade de Härnösand e se formou em engenharia mecânica na Härnösand Läroverk. Em 1942, iniciou trabalhos numa empresa de aviação onde, entre outros projetos, foi responsável pelo desenvolvimento de sistemas de ejeção.

Em 1958, iniciou sua trajetória profissional na Volvo, como engenheiro de segurança. Trabalhou no desenvolvimento do cinto de três pontos durante cerca de um ano, transportando para esse projeto os conceitos dos sistemas de ejeção que havia estudado inicialmente. Sua preocupação principal baseava-se em como manter o motorista e demais ocupantes (em especial da dianteira) seguros durante um acidente. Apresentou o cinto de segurança de três pontos em 1959 e, posteriormente, comandou o Departamento Central de Pesquisa e Desenvolvimento da Volvo, onde se manteve até 1985.

Ao longo da carreira recebeu várias distinções pelo seu trabalho, com destaque para a entrada, em 1989, para o “Hall of Fame for Safety and Health” e, em 1999, para o “Automotive Hall of Fame”.

A Volvo fez questão de patentear a inovação, mas deixando-a aberta, o que significava que estava totalmente disponível para quem a quisesse utilizar. Todos os motoristas do mundo podiam assim se beneficiar dessa tecnologia de segurança, independente da marca que estivessem conduzindo. Este foi um marco histórico do marketing e do compromisso da Volvo com a segurança, que quase foi por água abaixo com a fraude publicitária descoberta em 1990 (veja aqui).

Em 1963, a Volvo introduziu este cinto de segurança nos seus carros vendidos no mercado americano e em outros países. Contudo, antes do lançamento, a Volvo promoveu uma série de testes em veículos equipados com diferentes tipos de cintos de segurança. Os resultados foram esclarecedores: o novo cinto de segurança de três pontos da Volvo era, de longe, aquele que proporcionava melhor proteção aos passageiros.

Alguns anos mais tarde, em 1967, a marca sueca apresentou numa conferência de segurança rodoviária nos Estados Unidos, o estudo “28.000 Accident Report”. Este relatório havia sido construído com base nos dados recolhidos na Suécia, relativos a todas as colisões ocorridas naquele país com veículos Volvo no ano anterior. Aqui também os resultados foram evidentes, e o mundo finalmente tomou consciência da importância do uso desse recurso. Os estudos indicavam claramente que o uso do cinto de segurança salvava vidas e reduzia a gravidade das lesões entre 50% e 60%.

Não é possível contabilizar com exatidão o número de pessoas salvas graças à utilização do cinto de segurança de três pontos. Estima-se que, em nível global, mais de 1 milhão de pessoas deva a vida à sua utilização e muitas mais tenham evitado lesões graves.

Exatos 65 anos após a sua invenção, o potencial ainda é enorme. A sua utilização ainda é o fator mais eficaz, aquele capaz de garantir a melhor segurança dos ocupantes de um veículo em caso de acidente. Mas sua utilização difere muito de país para país. Nos Estados Unidos, estima-se que cada aumento na porcentagem de utilização seja capaz de salvar 270 vidas por ano. O seu potencial em Africa, na Ásia e na América do Sul é enorme, regiões onde a porcentagem de utilização em automóveis segue aumentando, apesar de que no Brasil sua utilização é obrigatória por lei, mas nem sempre obedecida.

Os cintos de segurança de três pontos que hoje equipam milhões de carros mundo afora, mantêm a ideia básica de Bohlin, mas são um prodígio de tecnologia: inteligentes, interativos, permanentemente prontos para intervir e “segurar” os nossos corpos caso algo de anormal aconteça. E, mais importante, preservar vidas.


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