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TESTE: Fiat Titano 2.2 Ranch

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A Peugeot até dois anos atrás planejava ter sua picape média -a Landtrek- lançada no Brasil, o que será totalmente fora das características da marca. Tratava-se de um produto criado na China em conjunto com a Changan e apresentado em 2020, nascida naquele país a partir de um projeto de 2019 então batizado de Kaicene F70. Seria montada no Uruguai para atender o mercado brasileiro.

por Ricardo Caruso

Mas a Stellantis pensou diferente e concluiu que seria melhor que a picape média fosse caracterizada como um produto Fiat, aproveitando a boa fama das Strada e Toro e a grande rede de concessionárias da marca italiana para seus diversos modelos comerciais. Uma ideia inteligente para, a partir de um produto já pronto, preencher fatias de mercado em diversos países. Assim, feita no Uruguai para o Brasil, esta é a Fiat Titano. A ideia é atender aqueles clientes que buscam um produto do segmento menos urbano e maior, apto ao trabalho mais pesado.

 A estrutura desta picape é clássica para esse tipo de veículo, com carroceria de cabine dupla e caçamba montada em chassi de longarinas, eixo traseiro rígido com suspensão por feixe de molas de quatro apoios, e suspensão dianteira independente com dois braços superpostos. A receita básica para evitar problemas.

Antes mesmo de realmente ser comercializada, a Titano foi avaliada pela engenharia da Stellantis em todas as situações de uso, ainda com a roupagem da Peugeot, já que picapes no Brasil devem ter 1001 utilidades, desde chafurdar na lama e enfrentar pisos deteriorados, até levar crianças à escola e estacionar em shopping centers. Por isso, o maior argumento de vendas tinha que ser o preço competitivo e facilidade de manutenção, servida pela rede de concessionárias que não é pequena.

Primeiro era preciso oferecer um motor resistente, e o escolhido veio dos furgões da Stellantis, o excelente BlueHDI 2.2 turbodiesel, que nasceu ainda na PSA e é comum na Europa, com projeto que não inventou muito e sem maiores dificuldades de manutenção. Tem 180 cv de potência máxima e 40,8 mkgf de torque também máximo, na média do que oferecem praticamente todas as picapes concorrentes; a Ranger 2.0, por exemplo, tem 170 cv e 41,3 mkgf, enquanto as demais ficam mais acima nesses números.  A escolha da transmissão também buscou maior confiabilidade, com câmbio automático de seis marchas, tração 4×4 e reduzida com relação de 1/2,72 e bloqueio do diferencial traseiro. O seletor de tração é eletrônico, com um comando giratório no painel oferecendo “4×2”, “4×4” e “reduzida”; tudo funcionou de maneira perfeita durante nossa avaliação.

O que nasceu como um “Peugeot chinês” não precisou de maiores mudanças estéticas. Grade, tampa traseira, calotinhas e volante receberam os emblemas da marca italiana, e as linhas não passaram por mudanças. Para quem conhece os Peugeot a fundo, vai notar essa herança nas luzes diurnas e no conjunto de botões do painel, que remetem ao Peugeot 3008. Não há nada do restante da “família” (leia-se Strada e Toro) na Titano, pelo menos por enquanto. O sistema multimídia, por exemplo, que é um dos destaques dos Fiat, nesse caso é mais simples, com tela de 10 polegadas, e espelhamento por fios (usa cabo) para Android Auto e Apple CarPlay. Os instrumentos tem layout próprio, em nada lembrando os painéis usados pela Fiat. Apenas detalhes que em nada atrapalham o uso dessa picape.

Interessante é que a Changan que deu origem a Kaicene, Landtrek, Titano e até a Ram 1200 mexicana acabou de receber mudanças na China e ficou mais atualizada e alinhada com os concorrentes mundo afora. Mesmo assim, não há o que reclamar do visual da Titano em termos de Brasil, mercado tradicionalmente pouco exigente. A Titano que AUTO&TÉCNICA avaliou, na versão topo de linha Ranch (R$ 260 mil) traz alguns cromados e rodas de 18 polegadas, que agrada os agro-compradores e chamou a atenção nas ruas, principalmente pela cor Vermelho Tramonto e faróis e lanternas com LEDs, itens exclusivos desta versão. 

O motor 2.2 turbodiesel é suave e quase silencioso. Quase, por que o isolamento acústico da cabine pode ser melhorado pela Stellantis, para abafar os ruídos em rotações mais elevadas. O câmbio tem trocas de marchas tranquilas, mas poderia ser programado para esticar um pouco mais essas trocas e assim aproveitar melhor o motor; faz reduções com frequência, para aproveitar melhor o torque e potência disponíveis, o que pode incomodar alguns.

Mesmo assim, o desempenho é muito bom. Acelera de zero a 100 km/h (no modo Sport), em 11,7 segundos e chega aos 175 km/h; uma picape não precisa muito mais do que isso na verdade. As retomadas são boas, com 8,6 segundos de 40 a 100 km/h e 9,1 segundos de 80 a 120 km/h, sinal de ultrapassagens sem sustos.

O consumo, porém, denuncia um pouco a idade do projeto. Fizemos 9,3 km/litro na cidade e perto de 11 km/litro na estrada, o que uma relação pouco mais longa das marchas e/ou diferencial ajudaria a reduzir; a aerodinâmica influi, por causa da grande área frontal, mas é cedo para a marca pensar em mexer nisso. As suspensões trazem calibragem mais apropriada para o uso comercial da picape, diferente das Strada e Toro, que apresentam maior foco no conforto. Mas essa é a sina das picapes-raiz… A direção hidráulica tem peso correto, inclusive nas manobras (existem câmeras de 360 graus para ajudar). A caçamba tem capacidade para 1.020 kg (ou 1.220 litros) até a borda do compartimento. A tampa é pesada e há um amortecedor vendido como acessório nas concessionárias, e não conta com travamento pelo sistema elétrico do modelo. 

Por conta da origem do projeto, não oferece o mesmo conforto ao rodar das picapes com legado americano, como S10 e Ranger, pois nasceu para enfrentar vida mais dura na China, mas não chega a incomodar; as suspensões foram exaustivamente retrabalhadas pela Stellantis. A direção filtra bem as irregularidades do piso e a tendência a sair de traseira no limite de aderência, enquanto o controle de tração não atua, é normal para as características de modelos de tração traseira, eixo rígido e alta potência. Tudo sob controle da eletrônica, sem maiores sustos. Por conta da calibragem feita pela marca, é muito boa em piso ruim. 

CONCLUSÃO

A Fiat Titano é mais simples, menos potente que a maioria dos concorrentes e até parece ser mais antiga. Tudo isso dá para relevar, ainda mais lembrando que na versão Ranch, a mais completa, custa R$ 259.990, o mesmo que as versões de entrada, por exemplo, da Ford Ranger, Nissan Frontier ou Mitsubishi L200. A Titano Ranch traz faróis com LEDs, chave presencial com partida por botão, alerta de trocas de faixas, ar-condicionado de duas zonas, câmeras 360 graus, seis airbags e multimídia com tela de 10 polegadas. Os bancos são revestidos de material sintético que imita couro e o acabamento interno, sem ser luxuoso, é bem cuidado.

Por causa da idade do projeto (cinco anos hoje fazem muita diferença), não é exatamente a melhor picape oferecida no mercado brasileiro, mas também está longe de ser a pior. Tem atrativos como o preço mais do que competitivo e projeto focado no trabalho, algo que pode não agradar os compradores de Strada e Toro, que tem propostas diferentes; não seria a evolução natural para esses clientes. Mas é uma picape que vai trazer novos compradores para a marca e não vai decepcionar. A verdade é que a a adoção da Landtrek pela Fiat fez muito bem a esta picape, que assim deixou seu projeto chinês no passado.


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