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Primeiro de Abril? Quando a Volvo mentiu e arruinou sua reputação (e outros casos exemplares)

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O “Dia da Mentira” é um costume anual que acontece todo dia 1º de abril e que consiste em abusar de piadas e pegadinhas, a maioria sem a menor graça. Os “humoristas” costumam, após expor suas ações, gritar “Primeiro de Abril!” para a suas vítimas. Pelo mundo afora, muitas empresas veiculam anúncios que podem estar envolvidos com essas pegadinhas, que são reveladas como tal no dia seguinte. O costume de reservar um dia do ano para pregar peças inofensivas ao próximo tem sido relativamente comum em diversos países. A origem do Primeiro de Abril é desconhecida, mas existem muitas teorias em torno dele, mas que devem ser mentirinhas também.

Fora as brincadeiras de Primeiro de Abril, mentir sempre foi um péssimo negócio, ainda mais quando envolve grandes empresas e montadoras de veículos. AUTO&TÉCNICA relembra algumas grandes mentiras que se tornaram problems gigantescos para algumas marcas. Em especial o caso da Volvo, que arruinou sua reputação de fazer os carros mais seguros do mundo. Confira.

por Ricardo Caruso

Ilustração: Disney

Um monster truck batizado de “Bear Foot” fez mais do que transformar uma fileira de carros em montes de metal retorcidos para um anúncio da Volvo em 1990, que visava impressionar o público da TV norte-americana da maneira mais espetacular possível. A Volvo historicamente apoiava todo seu marketing na ideia de que seus carros eram os mais seguros do mundo. Na verdade a segurança até era bem cuidada (não existe nada exatamente seguro que ande a mais de 100 km/h), mas a narrativa da marca acabou ali.

Uma mentira quase arrasou a reputação internacional da sueca Volvo, forçou a agência de publicidade que criou o anúncio a renunciar à conta de US$ 40 milhões da Volvo nos Estados Unidos após parceria que já durava 23 anos e abalou até a reputação do mercado publicitário dos Estados Unidos.

E por que isso aconteceu? Porque o comercial, destinado a exibir o renomado histórico de segurança da Volvo, na verdade foi fraudado e condenado como “uma farsa e uma mentira” pela justiça dos Estados Unidos. No filme, o monster truck ia esmagando os carros que estavam no seu caminho, menos o Volvo, que permanecia com sua estrutura intacta.

A posição confiante da Volvo em matéria de segurança ganharia mais espaço ao dar a ideia de que os seus engenheiros descobriram que as colunas reforçados de qualquer Volvo eram suficientemente fortes para suportar o peso da picape, equivalente a seis carros, empilhados em cima dele. Tendo capitalizado isto em anúncios impressos nos Estados Unidos, a Volvo pediu para sua agência publicitária local, a Scali, McCabe, Sloves (SMS), estender a tese à televisão.

Filmado diante de uma plateia paga em Austin, no Texas, o comercial mostrava a picape monstruosa destruindo uma fila de carros, exceto um Volvo solitário que estava entre eles. No entanto, o impacto do anúncio rapidamente desapareceu quando surgiram relatos de que o Volvo tinha sido reforçado em suas colunas, e que as colunas estruturais dos outros carros tinham sido cortadas ou até removidas, apenas encaixadas no lugar.

Desmascarada, a Volvo se mostrou extremamente envergonhada e admitiu que modificações feitas no seu carro para as filmagens aconteceram por razões de segurança e “para fins de filmagem”, mas não explicou o motivo de sabotar os outros carros. Foi forçada a retirar a campanha do ar, publicar anúncios na imprensa pedindo desculpas por isso e pagar uma multa de US$ 150.000 à Comissão Federal de Comércio por “publicidade enganosa”.

Contudo, os danos à Volvo foram muito maiores do que uma multa e a vergonha pública. O erro acabou com o seu “marketing da segurança” e se revelou um enorme presente para os fabricantes de automóveis japoneses, que estavam começando a entrar no mercado americano de veículos familiares. E mais: cinco meses após o escândalo, a agência SMS renunciou à conta da Volvo, com a perda -além da financeira- de cerca de 50 empregos; em 1993, a SMS foi comprada pela Lowe Worldwide por US$ 55,5 milhões e incorporada pela Lowe and Partners, e desapareceu.

E de onde veio a absurda ideia? A Volvo da América do Norte teve a ideia de uma campanha fortemente focada na segurança nos Estados Unidos depois de descobrir que 54 carros da sua marca, que aguardavam descarregamento de um navio em Mobile, Alabama, sofreram apenas danos mínimos após a passagem de um furacão… Na verdade, o furacão veio depois.

No Brasil, em 1995, a Cetesb, Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental, de São Paulo, identificou fraudes nos níveis de emissões de mais de 400 mil exemplares do Fiat Mille Electronic, produzidas desde 1992. Numa época em que os carros tinham pouca eletrônica a bordo, a Fiat desenvolveu um modo curioso de detectar que estava em processo de testes de emissões: quando o capô era aberto e a luz de cortesia do compartimento do motor acendia, o motor entrava em outra calibração, no modo de baixa emissão, e assim passava nos testes. Com o capô fechado, a luz apagava e o pequeno Fiat emitia mais poluentes. Numa escala maior temos o “dieselgate” recente da Volkswagen, que fraudava a emissão de poluentes em seus motores diesel. O sistema identificava que o modelo estava em teste quando, parado, as rodas de tração se moviam, e assim ele entrava em modo menos poluente. Custou muito dinheiro em multas e indenizações, e abalou a reputação da marca mundo afora.

Houve uma época em que a CAOA mentia bastante em seus anúncios, onde alegava que seus carros Hyundai eram os melhores do mundo nisso ou naquilo. Eram apenas factóides, como o caso da potência do Hyundai Veloster. O carro foi lançado no Brasil amparado por uma campanha publicitária que afirmava que o curioso cupê de três portas tinha motor 1.6 com injeção direta e 140 cv. Na verdade, o sistema de injeção não era indireto, e sim convencional, e o motor rendia 128 cv.

Nessa mesma linha, de inflar números, a Honda vendia no Brasil o Fit com duas opções de motor: 1.3 e 1.5. O 1.5 era anunciado como 1.5, mas o 1.3 era divulgado como 1.4. Pelos costumes básicos da matemática aplicada em automóveis, o arredondamento da cilindrada do motor de 1.339 cm3 deveria ser 1.3, ou seja, para baixo e não para cima. Mas a área de marketing da empresa não pensava assim e o número escolhido foi o 1.4. A GM também fez uma trapalhada em 2010, ao anunciar que o Volt era um veículo elétrico, quando na verdade era um híbrido.

Certa vez, numa renomada loja de miniaturas em São Paulo, encontramos um belo exemplar que trazia em destaque na caixa “Edição Limitada e Numerada, de apenas 1800 peças”. Mas a que estava em nossas mãos era número 2200… Nem o vendedor soube explicar. O mesmo aconteceu, numa escala literalmente maior, com a Kombi Last Edition, feita para marcar o fim de produção do simpático modelo da Volkswagen.

A série especial, lançada em 2013 e anunciada como limitada a 600 unidades, custava uma fortuna. Diante do êxito inicial, ao invés de comemorar o sucesso da série, a marca decidiu -sem alarde- prosseguir e fabricou mais 600 dessas Kombi. O resultado foi o encalhe nas concessionárias, desvalorização do modelo e reclamações até na justiça de quem havia comprado um carro que deveria ser quase exclusivo, mas não foi.


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